Ao apostar que alguém
consegue pensar antes de cometer um ato violento, a campanha “Conte até 10” torna-se paradoxal, pois
propõe que o sujeito faça justamente o que é irrealizável
No início de novembro, entrou em vigor a campanha “Conte até 10”, organizada pelo Conselho
Nacional do Ministério Público em parceria com o Ministério da Justiça e o
Conselho Nacional de Justiça. O objetivo é combater assassinatos por motivo
fútil – matar por uma briga, por ciúme, por discussão no trânsito, por
homofobia, por intolerância religiosa, por racismo ou por vingança. É uma
aposta na lógica da conscientização no que diz respeito a barrar o ato impensado.
A campanha considera, assim, o fato de contar até 10 como uma
espécie de tempo para pensar a sua ação antes de colocá-la em ato. Perguntamo-nos:
“Será a consciência capaz de barrar o ato criminoso?”
Freud já no início do século passado nos alertava para os limites da
consciência em pleno movimento filosófico da primazia da consciência.
Mais tarde, o psicanalista Jacques Lacan contrapunha a máxima
cartesiana “penso, logo existo” à afirmação de que “existimos onde não
pensamos”.
Essa inversão aponta outra lógica, não da consciência, mas
do inconsciente. Assim, podemos considerar, ao invés de uma mera contagem, precisamos é calcular. Nesta matemática, temos que computar a existência do outro: “o outro como alteridade”. A agressividade advém do erro do cálculo. Quando o outro não faz parte do conjunto como um diferente de mim, dá-se a passagem ao ato. É uma relação mortífera na qual está ou eu, ou o outro. Tal qual Freud nos aponta em Totem e Tabu, do assassinato do pai da horda primeira, assim, a sociedade para não se auto exterminar precisou fazer funcionar o Simbólico. É através da palavra que os sujeitos constroem o tempo, tempo necessário de pausa entre o ato e o (diz) ato.
do inconsciente. Assim, podemos considerar, ao invés de uma mera contagem, precisamos é calcular. Nesta matemática, temos que computar a existência do outro: “o outro como alteridade”. A agressividade advém do erro do cálculo. Quando o outro não faz parte do conjunto como um diferente de mim, dá-se a passagem ao ato. É uma relação mortífera na qual está ou eu, ou o outro. Tal qual Freud nos aponta em Totem e Tabu, do assassinato do pai da horda primeira, assim, a sociedade para não se auto exterminar precisou fazer funcionar o Simbólico. É através da palavra que os sujeitos constroem o tempo, tempo necessário de pausa entre o ato e o (diz) ato.
A campanha "Conte até 10" tem o seu valor: R$ 370 mil e a
colaboração dos lutadores de MMA Anderson Silva e Júnior Cigano e os
judocas medalhistas olímpicos Sarah Menezes e Leandro Guilheiro. E pode
funcionar como alerta. Mas ao buscar controlar o ato impensado, apostando que
enquanto se conta, é possível pensar antes de atuar, torna-se paradoxal. O que
a campanha propõe que o sujeito efetive, é justamente onde está o irrealizável
para ele. Ao propor que o sujeito conte, o que se está querendo é que ele
institua um “tempo simbólico” que irá barrar a passagem ao ato.
Mas, a questão do ato é esta: aquilo que o sujeito não consegue
simbolizar – o que ele não consegue passar pela palavra, ele realiza no ato.
Será que, ao darmos as “palavras” ao sujeito ele se apropriará destas, e, tal
qual Ali Babá ao proferir “Abre-te Sésamo!”, conseguirá ultrapassar o desejo de
matar e adentrar as profundezas de sua caverna, retornando com suas
preciosidades? Será que contar até dez é suficiente?
Lisiane Fachinetto e Maralice Neves
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